COMO É IMPORTANTE FAZERMOS ESPAÇOS PARA QUE AS PESSOAS OS AMEM E CUIDE-OS

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Conhecida por transformar a mobilidade de diversas cidades do mundo, a urbanista americana Janette Sadik-Khan foi a última conferencista do Fronteiras do Pensamento em Porto Alegre, 2015. Em sua palestra, Sadik-Khan empolgou o público ao enfatizar, inúmeras vezes, o quão simples pode ser uma mudança no espaço urbano – simples, rápido e barato, três características sempre presentes em seus planejamentos.

Segundo a urbanista, o diálogo direto com moradores e comerciantes das regiões a serem transformadas é crucial. Outras prioridades são as vagas de estacionamento, a carga e a descarga para o comércio e transporte público de alta qualidade.

Sadik-Khan celebrou as mudanças culturais que ocorrem quando as ruas mudam. As pessoas se aproximam, o espírito de comunidade aumenta, mas, para ela, ainda mais importante do que expandir a possibilidade da vida nas ruas é reduzir o número de mortes por acidentes: “todos os projetos transformaram a cidade, mas o impacto mais importante foi diminuir os acidentes e mortes. No final do mandato de Michael Bloomberg, tivemos o número mais baixo de acidentes desde 1930. As estratégias mudam a hierarquia das ruas. Colocamos as pessoas em primeiro lugar“, afirmou a convidada.

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Janette Sadik-Khan

 Após a conferência, Janette Sadik-Khan respondeu as perguntas do público. Dentre elas, a Pergunta Braskem, enviada pelos seguidores do Fronteiras nos canais digitais, patrocinados pela Braskem. Desta vez, a pergunta selecionada veio de Marco Aurélio Soares. Confira abaixo:

Marco Aurélio Soares: “Acho que a Terra tem limites que faltam ser considerados no crescimento. É preciso reduzir o desenvolvimento, ou regredir, ou há formas de crescimento urbano que permitam, ao mesmo tempo, respeitar os limites da Terra?”

Janette Sadik-Khan: Sim, é preciso respeitar os limites naturais. Este é um ponto muito importante, porque o futuro do planeta é nas cidades. Metade da população mundial já está nas cidades e, até 2040, será 70%. Para que as cidades funcionem melhor, levar isso em conta é importantíssimo. Acho que o primeiro passo é fazer o possível para melhorarmos nossos padrões de uso de solo. Repensar os sistemas de transporte para o futuro é outro ponto crucial, porque, no passado, nossa ideia de desenvolvimento urbano ampliou demasiadamente o tamanho das cidades e isso dificultou a locomoção das pessoas, gerando diversos problemas. Enfim, é uma pergunta importante com uma reflexão básica que chega bem ao foco da grande questão: o futuro das cidades está diretamente ligado ao futuro do planeta.

Confira abaixo outras ideias de Janette Sadik-Khan ao responder as perguntas do público:

Acessibilidade:

“Todos nós, mesmo que temporariamente, teremos necessidades especiais. Temos que olhar os projetos de nossas ruas desta forma. Ao rebaixar uma calçada, você não está ajudando apenas cadeirantes, você está ajudando mães com carrinhos de bebê, são coisas que melhoram a cidade como um todo.”

Poluição:

“Nós monitoramos alguns pontos da cidade, como Times Square, onde houve uma redução de 40% de CO2. Um dos grandes problemas de NY é a poluição e o sistema de calefação dos prédios. A cidade de NY é a que tem a maior pegada de poluição dos Estados Unidos. Nossa estratégia é também focar na eficiência dos prédios que poluem muito com aquecimento no inverno.” Uber e empresas similares “Os sistemas de transporte, incluindo as empresas de táxi, não estão no nível desejado da população. Então, não é uma surpresa a popularidade do Uber com toda sua facilidade. O que temos que fazer é desenhar uma cidade que funcione como rede e que empresas como a Uber possam servir como coisas positivas à nossa rede e não simplesmente mais e mais carros, repetindo erros do passado. Em NY, temos 13 mil táxis amarelos e 30 mil Ubers. Não há volta para isso. Não há dúvida de que o futuro do transporte público incluirá a Uber e a Lyft.”

Do sonho do carro próprio ao sonho da mobilidade urbana:

“É uma mudança cultural muito grande. Mas, em primeiro lugar, para as pessoas não quererem um carro, você tem que dar opções de altíssima qualidade, ônibus com muita qualidade e bicicletas com faixas seguras, senão não funcionará. É assim que elas deixarão o carro em casa. Nos EUA, cada vez mais, os jovens nem compram carros, porque estão fazendo uso da economia compartilhada. Lá, carros ficam ociosos 98% das vezes, são usados apenas no fim de semana. O futuro da cidade é mudar o propósito das cidades. É por isso que você vê as cidades do futuro se afastando de projetos para carros e investindo em bons ônibus e estratégias para pedestres.”

Agora, falando em específico sobre projetos numa escala menor, se dá o exemplo de projeto que cultua com o título do texto, “Como é importante fazermos espaços para que as pessoas os amem e cuide-os”, do arquiteto croata Nikola Bašić que projetou o “Sea Organ” (Órgão do Mar, em português).

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Sea Organ | Visão aérea | Foto: Elderberry Street

Construída em 2005 na cidade de Zadar, na Croácia, a obra – que é uma mistura de instrumento musical e mobiliário urbano – possui cerca de 70 metros de comprimento e incorpora 35 tubos de polietileno de tamanhos variáveis e dispostos em profundidades diferentes. À medida que a água do mar entra na estrutura, os tubos são movimentados e uma coluna de ar é “soprada”, fazendo com que sons em forma de assovios sejam emitidos para o exterior através de pequenas aberturas.

O projeto foi o vencedor do Prêmio Europeu de Espaço Público Urbano em 2006 e leva milhares de turistas para o litoral de Zadar todos os anos, que ouvem e sentem a incrível interação entre natureza e design através do Sea Organ.

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Sea Organ | Detalhes | Foto: Elderberry Street

 

Referências: Bimbon, Ecodesenvolvimento

*Texto | Catarina Schmitz Feijó